Jovens Unidos Pelo Amor à Cristo,
Na ultima postagem apresentamos o
que nos ensina o Catecismo da Igreja Católica sobre os Anjos. Continuemos a
temática agora, contando a história de São Miguel Arcanjo, que fiel ao Criador,
liderou o controle da rebelião de Lúcifer e dos anjos malvados contra Deus e
lançou-os no inferno.
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Quem como Deus?
Pedro Morazzani
Arráiz
Os anjos foram dotados por Deus de inteligência perfeitíssima e, no
entanto, pecaram, revoltando-se contra seu Criador. Mistério do mal... São
Miguel, por sua fidelidade, recebeu em prêmio a missão de proteger a Santa
Igreja.
O mistério da criação
Deus, Ser
absoluto e eterno, não precisava de nenhuma criatura que Lhe rendesse
homenagens e reconhecesse sua grandeza sem limites. Entretanto, em sua
misericórdia, quis criar, não para aumentar a própria glória, intrínseca e
sempiterna, mas para manifestar seu amor todo-poderoso e "comunicar sua
glória" (1) aos seres por Ele criados, fazendo-os participar de sua
verdade, sua bondade e sua beleza.
Uma imensa
multidão de criaturas diversas e desiguais - seres visíveis e invisíveis,
inteligentes ou desprovidos de razão, dispostos numa maravilhosa hierarquia -
constituiu então a Ordem do universo, reflexo da perfeição adorável do Ser
infinito, que só se manifestaria totalmente, na plenitude dos tempos, por seu
Filho Unigênito, Jesus Cristo, o Verbo eterno encarnado.
Explica o
Doutor Angélico que "todo efeito representa algo da sua causa" (2).
Assim, em todas as criaturas podemos encontrar vestígios da eterna Sabedoria
que as tirou do nada: nos astros que enchem as vastidões do firmamento e cujas
constelações encontram-se separadas, às vezes, por milhões de anos-luz; nos
diminutos grãos de areia, jamais iguais entre si, que cobrem desertos e praias;
na variedade assombrosa de vegetais, que vai da "erva do campo que hoje
existe e amanhã é queimada" (Mt 6, 30) às seculares sequóias e jequitibás;
no admirável instinto dos insetos, na fidelidade quase inteligente de um cão,
na delicadeza virginal de um arminho, nos milhares de micróbios que podem
pulular numa gota de água... Mas quis Deus espelhar-se sobretudo no homem,
criando-o à sua imagem. E ao constituí-lo um composto de corpo corruptível e
alma imortal, o tornou elo de ligação entre a matéria e o mundo espiritual.
O mundo angélico
Porém, no alto
desta grandiosa hierarquia, "superando em perfeição todas as criaturas
visíveis" (3), colocou Deus a natureza angélica: espíritos puros,
inteligentes e capazes de amar, cheios da graça divina desde o início de sua
existência, na aurora da primeira manhã da criação. Distribuídos e ordenados
por Deus em nove coros (4) - Serafins, Querubins, Tronos, Dominações, Virtudes,
Potestades, Principados, Arcanjos e Anjos - constituem o exército da celeste
Jerusalém e receberam a tríplice missão de perpétuos adoradores da Santíssima
Trindade, executores dos divinos desígnios e protetores do gênero humano.
Imensa e
incalculável é esta corte do Senhor. "Porventura podem ser contadas as
suas legiões?", pergunta o livro de Jó (25, 3). E o profeta Daniel,
abismado, escreveu: "Eram milhares de milhares os que o serviam, e mil
milhões os que assistiam diante d'Ele" (Dn 7, 10). Entretanto, cada um
desses espíritos possui uma personalidade própria, inconfundível e específica,
não havendo sido criado um igual ao outro (5).
O primeiro dos anjos
A tanta
diversidade e esplendor quis Deus colocar um ápice, um ponto monárquico, um ser
que espelhasse de modo inigualável a luz eterna e inextinguível. Maravilha
dentre as maravilhas, obra-prima do mundo angélico, fulgurava no mais alto dos
coros e todos extasiavam-se diante dele. "Tu és o selo da semelhança de
Deus, cheio de sabedoria e perfeito na beleza; tu vivias nas delícias do
paraíso de Deus e tudo foi empregado em realçar a tua formosura!" (cf. Ez
28, 12-13).
Sendo o
primeiro dos serafins, iluminava todos os espíritos celestes com os reflexos da
divindade que sua inteligência ímpar discernia com o auxílio da graça. Lúcifer
era seu nome: o que levava a luz...
A prova dos espíritos celestes
Entretanto,
antes de poder contemplar, por toda a eternidade, a essência de Deus, deviam os
anjos passar por uma prova, e apesar da altíssima perfeição da sua natureza,
"não podiam dirigir-se a esta bem-aventurança por sua vontade, sem ajuda
da graça de Deus" (6).
Diante deles a
face do Ser infinito permanecia como que envolta em penumbras e só seus
reflexos eram capazes de alimentar o ardente amor das legiões do Senhor.
Segundo
afirmam Tertuliano, São Cipriano, São Basílio, São Bernardo e outros santos, a
prova que decidiu o destino eterno dos espíritos angélicos foi o anúncio da
Encarnação do Verbo, Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, o qual
haveria de nascer da Virgem Maria.
Podemos
imaginar, então, que um frêmito de assombro percorreu as fileiras das milícias
celestes ao conhecerem intuitivamente, por uma ação de Deus, o plano da
Salvação: o Criador eterno, inacessível, todo-poderoso, se uniria hipostaticamente
à natureza humana, elevando-a assim até o trono do Altíssimo; e uma mulher, a
Mãe de Deus, tornar-se-ia medianeira de todas as graças, seria exaltada por
cima dos coros angélicos e coroada Rainha do universo!
O inexplicável
surgia diante dos anjos como sendo o píncaro e o centro da obra da criação.
A prova havia
chegado. Amar sem entender! Amar sobre todas as coisas ao Deus Altíssimo que
numa sublime manifestação de seu amor havia tirado do nada todas as criaturas!
Reconhecer, num supremo lance de adoração e submissão, a superioridade infinita
da Bondade absoluta e eterna! Era este o ato que confirmaria os espíritos
angélicos na graça divina e os introduziria na visão beatífica para todo o
sempre.
A primeira revolução da História
Lúcifer,
porém, duvidou diante de um mistério que ultrapassava seu angélico
entendimento. Será que Deus ignorava a natureza perfeitíssima dos anjos e
preferia unir-Se a um ser humano, tão inferior a eles na ordem das criaturas?
Ele, o mais alto dos serafins, seria compelido a adorar um homem? "Esta
união hipostática do homem com o Verbo pareceu-lhe intolerável e desejou que
fosse realizada com ele", afirma Cornélio a Lápide (7). Sim, só a ele
mesmo, Lúcifer, "o perfeito desde o dia da criação" (Ez 28, 15),
deveria Deus unir-Se e deste modo constituí-lo como o mediador único e
necessário entre o Criador e as criaturas. Assim, "aquele que do nada
havia sido feito anjo, comparando-se, cheio de soberba, com o seu Criador,
pretendeu roubar o que era próprio do Filho de Deus", conclui São Bernardo
(8).
"O anjo pecou
querendo ser como Deus" (9) e o príncipe da luz tornou- se trevas.
Fez-se ouvir o
primeiro grito de revolta da história da criação: "Não servirei! Subirei
até o Céu, estabelecerei o meu trono acima dos astros de Deus, sentar-me-ei
sobre o monte da aliança! Serei semelhante ao Altíssimo!" (cf. Is
14,13-14).
O defensor da glória de Deus
Ecoou, então,
um brado no Céu: "Quem como Deus?"
Entre o anjo
revoltado e o trono do Todo-Poderoso erguia-se "um dos primeiros príncipes"
(Dn 10, 3), um serafim incomparavelmente mais esplendoroso e forte do que havia
sido "o que levava a luz".
Quem era este
que ousava desafiar o mais alto dos anjos e agora refulgia invencível,
revestido do "poder da justiça divina, mais forte que toda a força natural
dos anjos" (10)?
Quem era este?
Chama viva de amor, labareda de zelo e humildade, executor da divina justiça.
"Quem
como Deus?" - Milhões de milhões dos espíritos celestes repetiram o mesmo
brado de fidelidade.
"Quem
como Deus?" - Este sinal de fidelidade, que em hebraico se diz Mi-ka-el,
passou a ser o nome daquele serafim que por sua caridade ímpar foi o primeiro a
levantar-se em defesa da Majestade ofendida.
Michael,
Miguel: nome que exprime, em sua sonora brevidade, o louvor mais completo, a
adoração mais perfeita, o reconhecimento mais cheio de amor da transcendência
divina e a confissão mais humilde da contingência da criatura.
A primeira batalha de uma guerra eterna
"Houve no
Céu uma grande batalha" (Ap 12, 7). Luta entre anjos e demônios, luta da
luz contra as trevas, da fidelidade contra a soberba, da humildade e da ordem
contra o orgulho e a desordem. "Miguel e os seus anjos pelejavam contra o
dragão, e o dragão com os seus anjos pelejavam contra ele" (Ap 12, 7).
Satanás,
desvairado de orgulho e "obstinado em seu pecado" (11),
"arrastou a terça parte" (Ap 12, 4) dos espíritos angélicos,
submergindo-os consigo nas trevas eternas da revolta.
Porém, estes
não prevaleceram, nem o seu lugar se encontrou mais no Céu. Foi precipitado
aquele grande dragão, que se chama demônio e Satanás, e foram junto com ele os
seus anjos (cf. Ap 12, 8-9) nos abismos tenebrosos do inferno (cf. 2Pd 2, 4).
Um imenso
clamor encheu o universo: Como caíste do céu, ó astro resplandecente, que no
nascer do dia brilhavas? (cf. Is 14, 12). A tua soberba foi abatida até os
infernos! (cf. Is 14, 11).
E enquanto o
serafim revoltado era visto "cair do céu como um relâmpago" (Lc 10,
18) e ser condenado ao fogo inextinguível, "preparado para ele e os seu
anjos" (Mt 25, 41), São Miguel era elevado pelo Rei eterno ao píncaro da
hierarquia dos anjos fiéis e se tornava o "gloriosíssimo príncipe da
milícia celeste", como é designado pela liturgia da Santa Igreja Católica.
O novo campo de batalha
Restabelecida
a ordem nos céus angélicos, o campo de batalha onde prosseguiu a luta entre a
luz e as trevas passou a ser a terra dos homens. O anjo destronado conseguiu
seduzir nossos primeiros pais a pecarem, como ele, contra o Altíssimo, querendo
ser como deuses (cf. Gn 3,5), e o Senhor Deus declarou guerra ao tentador:
"Porei inimizades entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a
dela" (Gn 3, 15).
A partir deste
momento uma luta árdua contra o poder das trevas perpassa a história da
humanidade. Iniciada na origem do mundo, vai durar até o último dia, segundo as
palavras do Senhor. Inserido nesta batalha, o homem deve lutar sempre para
aderir ao bem (12).
Neste combate,
além das armas decisivas da graça de Deus, que recebemos superabundantemente
por meio dos sacramentos, contam os homens com o auxílio e a proteção dos
anjos. E ao príncipe da Jerusalém celeste corresponde a capitania de todas as
legiões angélicas na luta contra as forças do inferno, pela salvação das almas.
Assim, São Miguel continua na terra a luta triunfal que iniciou no Céu.
Protetor do povo eleito e da Santa Igreja
Foi São Miguel
o anjo tutelar do povo de Israel.
Nas Sagradas
Escrituras, é ele mencionado pela primeira vez no livro de Daniel. Este
profeta, ao escrever as revelações recebidas do anjo Gabriel sobre o combate
para libertar a nação eleita da servidão aos persas, afirma que ninguém a
defenderá "a não ser Miguel, vosso príncipe" (Dn 10, 22). E
acrescenta ao narrar as tribulações de épocas vindouras: "Naquele tempo, surgirá
Miguel, o grande príncipe, o protetor dos filhos de seu povo" (Dn 12, 1).
O serafim da
fidelidade não cessou de proteger o povo de Israel e velar pela fé da Sinagoga
até o momento supremo da morte de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Escureceu-se o
sol e houve trevas, a terra tremeu, fenderam-se as rochas e o véu do Templo -
monumental tecido de jacinto, púrpura e escarlate que cobria a entrada do
impenetrável "Santo dos Santos" - rasgou-se em duas partes, de alto a
baixo (cf. Mt 27, 51; Mc 15, 38; Lc 23, 45). Narra- nos o famoso historiador
judeu, Flávio Josefo, que depois desses acontecimentos os próprios sacerdotes
do Templo escutaram dentro do recinto sagrado uma misteriosa voz que clamava
repetidas vezes: "Saiamos daqui!" (13).
São Miguel, a
sentinela de Israel, abandonava definitivamente o Templo da Antiga Aliança,
inútil agora, porque o único e verdadeiro sacrifício acabava de consumar-se no
alto do Calvário. Do coração trespassado do Cordeiro Imaculado nascia a Santa
Igreja, Corpo Místico de Cristo, Templo eterno do Espírito Santo. E a partir
desse instante, Miguel o triunfador, o primeiro adorador do Verbo encarnado,
tornou-se também o vigilante protetor da única Igreja de Deus.
A este
respeito escreveu o cardeal Shuster: "Depois do ofício de pai legal de
Jesus Cristo, que corresponde a São José, não há na terra nenhum ministério
mais importante e mais sublime do que o conferido a São Miguel: protetor e
defensor da Igreja" (14).
Notas:
1) Catecismo da Igreja Católica,
319.
2) Suma Teológica, I, q. 45, a.
7.
3) Catecismo da Igreja Católica,
330.
4) Cf. Suma Teológica I, q. 108,
a. 5.
5) Cf. Idem, I, q. 50, a. 4.
6) Idem, I, q. 62, a. 2.
7) A. Bernet, Enquête sur les
Anges, Librairie Académique Perrin, 1997, p. 43.
8) Obras Completas, BAC, Madrid,
1953, vol. 1, p. 215.
9) Suma Teológica I, q. 65, a. 5.
10) Idem I, q. 109, a. 4.
11) Idem, I, q. 64, a. 2.
12) Gaudium et spes, 37, 2.
13) Cf. História dos hebreus,
Editorial das Américas, São Paulo, 1963, vol.8, p. 304.
14) Año Cristiano, BAC, Madrid,
2002, vol. 9, p. 266.
(Revista Arautos do Evangelho,
Set/2007, n. 69, p. 18 à 21)
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